Se você é contribuinte ou desenvolvedor da área de serviços, sabe que existem centenas de padrões de Nota Fiscal de Serviço Eletrônica em todo país. Esses padrões são criados pelas empresas de software que cuidam da NFSe dos municípios, contratadas através de licitações.
Em paralelo com a quantidade de layouts (que ultrapassa 100 tipos diferentes), ainda existem muitos municípios que utilizam a Nota Fiscal de Serviço de papel e não possuem um webservice de integração público, que é ainda mais complicada para os contribuintes que emitem NFSe em alto volume, e também não possuem um formato padrão.
Os desenvolvedores de software são quem mais sofrem com essa descentralização. Afinal, para conseguir atender em nível de escala nacional (ou pelo menos regional) é necessário desenvolver uma integração diferente do seu software para cada novo município atendido, desenvolvendo um novo layout de NFSe de acordo com as regras específicas do sistema da prefeitura.
Depois de desenvolver, ainda tem o trabalho para começar a emitir suas notas em produção. Isso porque cada prefeitura possui uma forma diferente de autorizar um CNPJ para começar emitir através de uma integração de sistema e algumas prefeituras ainda exigem a presença física do contribuinte na prefeitura para permitir a emissão
Neste cenário caótico, surge uma possível esperança para os desenvolvedores: a NFSe Nacional. Neste artigo, você irá compreender o projeto, seu propósito e seus principais desafios e obstáculos que o impediram de entrar em funcionamento até hoje.
O que é NFSe Nacional?
A NFSe Nacional é um projeto do Governo Federal para a criação de um padrão nacional da Nota Fiscal de Serviço Eletrônica, em um layout único que possa ser utilizado por qualquer município do território nacional.
Anunciado em 2016, o projeto é um esforço conjunto entre a Receita Federal e a Abrasf, para reduzir a dificuldade dos empresários e desenvolvedores com os múltiplos padrões municipais de NFSe e assim simplificar as integrações com as prefeituras para algo semelhante ao modelo 55, da NF-e.
Atualmente, o projeto NFSe Nacional está em fase de testes, correções de problemas e instabilidades e pilotagem com algumas primeiras cidades que aceitaram fazer parte do experimento. Neste período, um seleto grupo de empresas, está ajudando na definição dos requisitos do projeto, na construção dos canais de comunicação e nos testes de validações.
O projeto corre em duas frentes: Legal e Tecnológica.
Do ponto de vista da lei, está tramitando na Câmara dos Deputados, por meio do Projeto de Lei Complementar 521/18, o texto necessário para que o projeto aconteça dentro da lei brasileira.
Em uma visão ideal do projeto, o padrão nacional da NFSe traria a tão desejada simplificação do modelo de arrecadação do ISS, com regras em comum e webservice único. De forma que os contribuintes e desenvolvedores pudessem realizar uma única integração e emitir para inúmeras cidades.
Além da padronização de layout da NFSe, o projeto NFSe Nacional apresenta outras novidades para o contribuinte prestador de serviços. Confira:
Ambiente de Dados Nacional da NFSe
O projeto NFSe Nacional inclui um repositório nacional de notas, que está sendo desenvolvido pela Receita Federal, chamado de Ambiente de Dados Nacional da Nota Fiscal de Serviço eletrônica – ADN NFSe.
Após a implementação do projeto, as plataformas de autorização de NFSe das prefeituras deverão sincronizar as notas recebidas com o ADN NFSe. Deste modo, os contribuintes e contadores poderão consultá-las no ambiente nacional.
O Ambiente de Dados Nacional da NFSe oferecerá as seguintes funcionalidades:
- Contribuintes poderão acessar painel com todas as notas emitidas, autorizadas, substituídas e canceladas;
- Prefeituras poderão configurar serviços e alíquotas;
- Contribuintes de contadores poderão visualizar online os dados das notas;
- Entre outros recursos ainda não divulgados.
Emissor Gratuito de NFSe
Também incluso no projeto NFSe Nacional, está o desenvolvimento de um portal nacional gratuito para emissão de Notas Fiscais de Serviço eletrônicas, com o objetivo de fornecer para os contribuintes uma opção sem custos de emissão.
A ferramenta é ideal para prestadores de serviço com baixo volume de emissão, pois é necessário preencher manualmente os dados da NFSe (assim como é hoje nos portais das prefeituras).
Este emissor gratuito também estará disponível para Mobile, sob forma de um Aplicativo. Com isso, prestadores de serviço poderão emitir NFSe direto do celular ou tablet, além de consultar as NFSe emitidas contra seu CPF ou CNPJ e contestar serviços não prestados (caso ocorra).
Fim do RPS e surgimento do DPS
O Recibo Provisório de Serviço, utilizado no modelo da NFSe como um documento transitório que depois é convertido em uma Nota Fiscal de Serviço Eletrônica, dá lugar para o Declaração de Prestação de Serviço, que é uma espécie de DANFE da Nota Fiscal de Serviço.
Pela ausência do RPS, ocorre uma mudança grande no fluxo de autorização da NFSe: ao invés de gerar um documento provisório, só seria possível “imprimir” a Nota após a sua autorização do XML no servidor da NFSe Nacional, que retorna autorização junto com a impressão.
Mas se você está pensando nas instabilidades e como isso poderia travar uma operação, saiba que o projeto inclui o desenvolvimento de um Serviço de Contingência.
Com a extinção do RPS e surgimento do DPS, surge uma nova possibilidade também: a consulta da NFSe por chave. Assim como na NFe, será possível também buscar o documento eletrônico utilizando uma chave direto no webservice nacional.
Obstáculos e Desafios da NFSe Nacional
Quando olhamos para o projeto da NFSe Nacional, imaginamos um cenário motivador, onde os problemas enfrentados hoje seriam em sua maioria resolvidos.
A premissa do projeto NFSe Nacional é bem otimista e muito vantajosa para contribuintes, contadores, desenvolvedores e para o próprio governo. Esse último tem um interesse ainda maior no projeto, como nós iremos explicar logo abaixo.
No entanto, colocá-lo em prática é muito difícil, demorado e politicamente desafiador. A origem dessa dificuldade está na natureza tributária da Nota Fiscal de Serviços.
Imposto Sobre Serviço
A NFSe, assim como a NFS de papel, é emitida em operações de prestação de serviço. Neste tipo de operação, incide o ISS – Imposto Sobre Serviço.
O ISS é um tributo de ordem municipal, arrecadado pelas prefeituras. Por isso, a União, a Receita e o próprio Governo na figura do Fisco não podem obrigar as prefeituras aderirem ao projeto através de uma legislação ou lei. Isso seria inconstitucional, por ferir a autonomia dos prefeitos.
Deste modo, hoje cada município é responsável pelo seu serviço de declaração do ISS, por isso tem autonomia para contratar ou desenvolver seu próprio padrão de NFSe, ou nem disponibilizar NFSe e manter-se na versão de papel do documento.
Assim, o maior desafio para o projeto NFSe Nacional é encontrar uma forma de que seja aceita, de bom grado, por todos os mais de 5.500 municípios brasileiros. Esse é inclusive, o principal ponto de dúvida dos players envolvidos (fisco, empresas, contribuintes e prefeituras) em relação ao sucesso do projeto.
Fatores políticos
Como atualmente o ISS é descentralizado, as prefeituras têm total autonomia sobre o recolhimento e cobrança do imposto. Terceirizar esse recolhimento para um sistema federal significa abrir mão (no mínimo parcialmente) do controle sobre este processo. Isso com certeza não irá agradar a todos os prefeitos e políticos brasileiros.
Além disso, o prefeito está abrindo mão da realização da licitação para escolher seu fornecedor de Webservice.
É possível que o projeto enfrente também rejeição política por parte dos prefeitos e políticos na sua implementação.
Particularidades regionais
Assim como aconteceu na implementação da NFC-e, o projeto encontrou pela frente milhares de cenários diferentes e precisou se adaptar. Locais com conexão ruim de internet, por exemplo, foi apenas um dos cenários tecnológicos encontrados e que exigiram do Fisco ajustes e novas regras para se adaptarem a todos os contribuintes.
Quando um projeto busca uma padronização nacional, muita gente é afetada. Isso significa que ele irá enfrentar desafios que ainda sequer estão previstos.
Além das barreiras tecnológicas que o projeto pode enfrentar, há também questões administrativas, internas e situações específicas de cada uma das prefeituras, que podem travar o projeto.
Está previsto dentro do projeto a parametrização das prefeituras. Onde ela precisa seguir regras básicas e imutáveis, mas pode também inserir novos campos e novas necessidades específicas de cada caso. Com isso, o padrão fica quase único.
Implementação lenta
Entendemos que por conta de todos os desafios citados acima, a implantação da NFSe nacional será feita a passos curtos e sua massificação provavelmente ainda levará bastante tempo. Ainda há prefeituras que não contam nem com Webservices disponíveis e estão acostumadas com a Nota de Serviço de papel.
A exemplo do eSocial, é provável que a adesão das prefeituras seja bem devagar. E ainda encontraremos múltiplos padrões de prefeituras por um tempo.
Algumas conclusões podemos tirar do andamento e resultados esperados do projeto:
- Melhora, mas não resolve! O projeto vai ajudar em muitos pontos, mas ainda assim, devido a natureza do imposto, será impossível criar um modelo único, padronizado, que contemple todos os municípios do Brasil, suas particularidades e cenários políticos.
- O sonhado Padrão Único está longe de existir. Ainda vamos passar um longo (e longo) período onde o padrão da NFSe Nacional será apenas mais um padrão dentro de todos os outros. Então, ele será apenas mais uma integração para o desenvolvedor construir
- O projeto ainda está em uma fase muito incipiente. Embora já exista um piloto, ele ainda possui lacunas tecnológicas e fiscais que precisam ser ajustadas
- Calendário de implantação da NFSe Nacional
- O Projeto ainda não tem definido um calendário de implantação para os contribuintes. No primeiro semestre de 2019 foram feitos testes piloto em uma cidade, onde o projeto rodou em paralelo para fins de testes de tecnologia.
Porém, ainda há muito durante 2021 e 2022 para se construir em âmbito de tecnologia e infraestrutura para estar disponível nas cidades aos prestadores.